quarta-feira, abril 23, 2014

Chove há três dias. Chuvas consistentes e a atmosfera mantém-se quente e húmida, para além do meu corpo, que desde os pés, até à gola do pólo tenho tudo encharcado. 
A parte da manhã foi repleta de aulas, a falar sobre o mito do Adamastor. Escolhi, juntamente dos miúdos, o rapaz com a voz mais grossa e em cima da cadeira, de frente para nós, leu todo o discurso do gigante. Nós, sentados, fizemos de navegadores e eu, como sempre, de Vasco da Gama. 
Penso que perceberam a importância do mito ao lado do medo. Penso que também entenderam que somos capazes de ultrapassar as nossas dificuldades se tivermos coragem de as enfrentar. Foram duas aulas feitas da mesma forma, embora  em ritmos diferentes. 
E saí a transpirar delas e, mais uma vez, gostei de ter dramatizado as minhas aulas. Aliás, a minha pré-tese é sobre isso: A dramatização nas aulas para a captação da atenção dos alunos. Funciona sempre e aprendem no meio de tanta diversão. 
Como tinha de ficar mais dois blocos na escola, nos chamados "furos", decidi tratar de coisas chatas, relativas às reuniões de Encarregados de Educação. Sempre detestei ser Diretor de Turma e este ano calhou-me a coordenação do cargo. Algo duplamente monótono, quando o que eu gosto é de ter as mãos cobertas de giz e o quadro cheio de palavras. 
Ao passar pela sala de acolhimento, a Diretora chamou-me. Tinha dois jornalistas. Um deles fora aluno do Instituto e vinham fazer uma matéria sobre o Dia Internacional do Livro e dos Direitos de Autor. Pediu-me que os levasse à biblioteca e que rebuscasse alguns alunos para falarem dos livros que liam.
(E eu tremi e senti-me pequenino, pois deixei passar o dia, por lapso, por falta de rigor às datas referentes ao que me compete.)
Segui e arrastei uma colega. Levámos garotos, foram inquiridos, filmados e, no fim, dei uma entrevista, respondendo às perguntas "Qual a importância da leitura?"; "Os alunos lêem menos?" e terminei dizendo que como professor de Português, arranjo estratégias de os cativar. Tarefa que não é fácil no meio de tanta nintendo e ipad. 
Dei mais um bloco, almocei a correr, pois à tarde teria a reunião de Encarregados de Educação. Dar as notas, dizer que estudam pouco e que os pais estão a falhar em casa... Uma tarefa chata, pois, (in)felizmente não sou pai e sei o quão difícil é ouvir algumas coisas. Uma das senhoras, ao sair, por viver perto de mim em Lisboa e criarmos alguma empatia, perguntou como estava a minha mãe e a minha namorada. Foi um misto de sensações e, eu gelado no meu pensamento, sorri e disse que estavam bem e que já tinha saudades. 
Pelos vistos ser Diretor de Turma também tem coisas boas. Aquilo que chamamos de afeto... 
A puta da vida surpreende-nos, às vezes mais do que algumas pessoas. 

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 Sobre a mão Se pegasses na minha mão e me guiasses pelo Parnaso, Os meus dias seriam menos sedentos e sombrios, Sem os espasmos de sofr...